Saúde Mental na Aprendizagem: Um Terreno Fértil para Flo(C)rescer

Aprender é muito mais do que acumular conhecimentos. É um processo que envolve a mente, o corpo e o coração. Exige que a mente esteja desperta, que o corpo encontre o seu equilíbrio e que o coração se sinta em segurança. É neste encontro entre o pensar, o agir e o sentir que a aprendizagem vai acontecendo. Falar de saúde mental é, por isso, falar das condições que tornam esse processo possível.

Para que a aprendizagem floresça de forma plena, é essencial que cada criança e jovem se sinta capaz, encontre sentido no que faz, construa relações gratificantes e desenvolva a confiança necessária para errar e recomeçar. Por isso, quando falamos de saúde mental na aprendizagem, referimo-nos à necessidade de garantir que cada criança e jovem possa crescer e desenvolver-se num ambiente que promova o seu equilíbrio emocional e que respeite o seu ritmo interno. 

De acordo com o “Referencial de Educação para a Saúde”, da Ordem dos Psicólogos Portugueses, uma em cada cinco crianças e jovens apresenta evidências de problemas de saúde psicológica. Muitos desses casos permanecem sem ser identificados ou acabam por ser desvalorizados no contexto escolar. Estes números lembram-nos da urgência de uma escola que, além de ensinar, saiba também cuidar, pois é impossível falar de sucesso educativo sem falar de bem-estar emocional. 

Na minha prática como psicóloga, vejo frequentemente como o equilíbrio emocional transforma a disponibilidade para aprender. Quando uma criança se sente segura, compreendida e confiante, o pensamento ganha liberdade para explorar, o erro deixa de ser ameaça e o processo de aprendizagem ganha vida. Pelo contrário, quando o medo, a ansiedade ou a tristeza ocupam espaço demais, o cérebro entra em modo de alerta, a atenção dispersa-se e a motivação enfraquece. De outra forma, podemos dizer que a mente só se abre ao conhecimento quando o coração se sente em segurança. 

É precisamente por isso que a escola tem um papel tão importante na promoção da saúde mental. Porém, cuidar da saúde mental na escola não se resume a responder ao sofrimento quando ele já se manifesta. Significa, antes de mais, criar condições que previnam esse sofrimento, através da promoção do bem-estar, do fortalecimento de fatores de proteção e da redução de fatores de risco. Uma escola emocionalmente saudável é aquela que oferece previsibilidade, empatia e segurança, onde há espaço para falar de sentimentos e onde os erros são vistos como parte natural do crescimento. É também aquela que valoriza cada criança e jovem pelo que é e não apenas pelo que faz. 

Quando este cuidado está presente, a escola passa a cumprir, verdadeiramente, a sua missão educativa. Mais do que um espaço de transmissão de conhecimentos, torna-se um lugar de desenvolvimento humano, onde cada criança e cada jovem é acompanhado no seu desenvolvimento integral a nível intelectual, social e emocional. É neste cruzamento que educação e saúde mental se encontram. Promover literacia emocional, desenvolver relações saudáveis, equilibrar a exigência com o apoio e cuidar de aspetos tão simples como o sono, a alimentação e o uso consciente das tecnologias são pilares essenciais para o sucesso educativo e para o bem-estar psicológico. Estes elementos, frequentemente menos valorizados, têm um impacto direto na capacidade de aprender e de viver com equilíbrio. 

Este compromisso com a saúde mental deve ser uma responsabilidade partilhada por toda a comunidade educativa. Professores, famílias, psicólogos e restantes agentes educativos têm papéis diferentes, mas igualmente fundamentais. Os professores, pelo contacto diário com as crianças e os jovens, estão numa posição privilegiada para reconhecer sinais de alerta, como um isolamento repentino, uma irritabilidade constante ou uma mudança de comportamento que possa ser um pedido silencioso de ajuda. As famílias, por sua vez, são o primeiro espaço de afeto e segurança emocional. Quando a escola e a família caminham juntas, as crianças e os jovens sentem-se protegidos e, consequentemente, disponíveis para aprender.  

Além disso, para que esta rede de cuidado seja verdadeiramente eficaz, é essencial que as escolas contem com profissionais especializados em saúde psicológica. O acompanhamento por psicólogos permite não só apoiar alunos em sofrimento, mas também orientar educadores e implementar programas de prevenção e promoção do bem-estar. Investir nestes recursos é investir em futuro, no desenvolvimento saudável de cada criança e jovem e na construção de comunidades educativas mais conscientes e saudáveis.

Quando a presença destes profissionais se junta ao compromisso de toda a comunidade educativa, a escola torna-se um verdadeiro espaço de crescimento. É aí que o aprender ganha sentido e o cuidar se transforma em parte do processo educativo. A saúde mental deixa de ser apenas uma preocupação e transforma-se numa cultura de cuidado, presente nas relações, nas rotinas e na forma como cada criança e cada jovem é acompanhado. Quando esse olhar se torna parte da cultura educativa, está criado um terreno fértil para que cada criança e jovem possa flo(C)rescer com o corpo em equilíbrio, o coração sereno e a mente disponível para aprender.

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Psicóloga Clínica

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