Cem anos depois: memórias de Fátima

José Valinho, sobrinho da Irmã Lúcia, Júlio dos Santos Rosa, José Soares, sobrinhos dos Beatos Francisco e Jacinta, João Vieira e José dos Santos, todos sacerdotes salesianos, testemunharam bem de perto os primeiros anos de Fátima.

Os sacerdotes salesianos José Valinho, nascido em 1926, Júlio dos Santos Rosa (1929-2017, falecido no passado dia 11 de março), José Soares (1931-2010), João Vieira, nascido em 1927, e José dos Santos (1926-2007) nasceram na zona de Fátima, viveram os primeiros anos de Fátima e ouviram os relatos, as dúvidas e as crenças de familiares e de vizinhos que estiveram presentes na Cova da Iria em 1917. Em 2005, depois do falecimento da Irmã Lúcia dos Santos, o Boletim Informativo publicou uma série de conversas, relatos das suas memórias. Recordamos esses testemunhos no ano do Centenário das Aparições de Nossa Senhora de Fátima e no ano em que o Papa Francisco aprova o milagre necessário para a canonização dos Beatos Francisco e Jacinta Marto.

A COVA DA IRIA

José Valinho, tal como os Pastorinhos, também costumava levar o seu rebanho para a zona da Cova da Iria. “Eu, com cinco anos, acompanhava já o meu irmão na guarda do rebanho. Só lá havia algumas casas, talvez umas cinco ou seis”, recordava. “Havia também por lá umas lojas ou barracas de madeira, para negócio, de alimentação, de artigos religiosos, de roupas…, especialmente nos dias de maior afluência de gente, 12 e 13 de cada mês. E lembro-me também que, depois dos dias 13, nós garotos, que andávamos com o rebanho, gostávamos de ir com ele para aqueles lados, não por devoção, mas à procura de alguma moeda perdida. E a verdade é que quase sempre encontrávamos alguma, meios-tostões, tostões, dois tostões… E quando se chegava a encontrar alguma moeda branca, cinco tostões, dez tostões, era uma autêntica festa”.

Maria dos Anjos, irmã de Lúcia, com Olimpia de Jesus e Manuel Pedro Marto, pais dos beatos Francisco e Jacinta, e, em baixo, com o filho, Pe. Valinho, em Aljustrel © Arquivo da Família Valinho

“A Cova da Iria era mesmo uma cova”, lembra também o Pe. João Vieira, “coberta de azinheiras, às quais se prendiam os burros pela arreata, e algumas oliveiras. No chão só se viam pedregulhos e muito mato. Sítio bom para as pastagens dos rebanhos, pois a erva crescia e abundava, entre pequenos arbustos” e “ideal para rezar e meditar”. “A minha terra, Alburitel, dista 15 quilómetros da Cova da Iria. Sentado, à beira da estrada, ainda por alcatroar, tinha 7 ou 8 anos, por lá me ficava sentado, à beira da estrada, a ver passar os carros, os automóveis e as camionetas que iam, nos dias 12 e 13, para a Cova da Iria e que eu ia apontando, fazendo um risco no chão. Ouvia falar dos milagres que aconteciam nos dias 13 na Cova da Iria e, pequeno ainda, ansiava ir também a Fátima para ver algum milagre. E, aconteceu que um dia, de manhã, bem cedinho, pelas 5 horas, com a minha mãe a cavalo do burro, único meio de transporte de então, e com a minha irmã Ana, lá fomos, juntamente com outros vizinhos, também com os seus jericos, a caminho da Cova da Iria. Lá chegados, prendemos o burro a uma azinheira, juntamente com outros jericos por ali espalhados, presos também às azinheiras e vindos de todas as redondezas. Todos juntos íamos participar na missa das 7 e meia, a missa da Comunhão Geral, defronte da Basílica, ainda só meio construída. Comungámos, rezámos e sentimo-nos imensamente felizes, junto de Nossa Senhora, perto da Capelinha das Aparições”.

O Padre José dos Santos, natural de Eira da Pedra, a 1 km de Fátima, recordava também em 2005 as suas memórias de criança: “grande parte das centenas de pessoas que em peregrinação acorriam a Fátima passava mesmo em frente à minha casa, isto nos anos trinta, era eu muito miúdo”.

Padres João Vieira, José dos Santos, Humberto Pasquale e José Valinho

“Sempre vi que os adultos naturais de lá, assim como também os jovens, respeitavam os peregrinos que passavam a rezar, ou a cantar, ou em atitudes de penitência”, lembrava o Pe. Júlio dos Santos Rosa. 

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